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Rua Larga

[rl1] Enquadramento, Google Earth, julho, 2024

Rua Larga

Antes da construção da Cidade Universitária de Coimbra, tal como a conhecemos hoje, esta rua já era uma das mais movimentadas e importantes da Alta, desempenhando um papel central na malha urbana medieval. Servia como eixo vital, assegurando a ligação entre o Arco do Castelo, que marcava um dos acessos ao antigo recinto muralhado, e a Porta Férrea, entrada monumental do Paço das Escolas. Era, assim, a artéria que unia o coração administrativo e académico da cidade ao tecido habitacional e comercial da Alta. Com a profunda transformação urbanística ocorrida nas décadas de 1940 e 1950, que resultou na criação da monumental Cidade Universitária, a rua ganhou um novo papel e uma nova configuração. Hoje, a via liga o Largo D. Dinis à Porta Férrea, funcionando como uma ponte simbólica e física entre o passado e o futuro.

[rl1] Rua Larga, [sc]

[rl2] Rua Larga

[rl3] Rua Larga

Num gesto arquitetónico contemporâneo, o espaço foi redesenhado pelo arquiteto Gonçalo Byrne, que procurou criar uma harmonia entre os elementos históricos e as necessidades modernas do campus universitário. Feita de pedra e ar, a reconfiguração desta ligação reflete uma visão de continuidade entre os tempos, preservando a memória histórica do local enquanto integra formas e materiais que dialogam com a arquitetura monumental do século XX e as exigências da atualidade.

[rl4] Rua Larga, [sc]

Destacam-se neste espaço, pelo seu interesse histórico e artístico, os seguintes elementos:

Associação Académica de Coimbra II - Por volta da década de 1920, a AAC encontrava-se instalada em condições precárias no Colégio de São Paulo Eremita, vulgarmente apelidado de "A Bastilha", na Rua Larga. O espaço era limitado a duas salas e um corredor sombrio, abafado e degradado, que mal serviam as necessidades crescentes dos estudantes. Este cenário contrastava fortemente com o piso superior do edifício, onde funcionava o chamado Clube dos Lentes, um local reservado aos mestres da Universidade, repleto de sofás confortáveis e outras comodidades que sublinhavam a diferença de tratamento entre docentes e discentes. Apesar de várias diligências junto da Universidade para melhorar as condições da AAC, as respostas que vinham da Porta Férrea limitavam-se a promessas vagas e boas intenções, sem qualquer resultado prático. Foi então que um grupo de estudantes mais audaciosos decidiu tomar a situação em mãos. O chamado Comité Central, composto por figuras influentes do meio académico da época, mobilizou cerca de quarenta Conjurados para organizar uma ação revolucionária. O objetivo era claro: tomar o Clube dos Lentes e convertê-lo em espaço dedicado aos estudantes. O plano foi cuidadosamente traçado. Numa das reuniões secretas, realizada na Torre do Anto, ficou decidido que o assalto aconteceria no dia 1 de dezembro, como forma de homenagear simbolicamente a Restauração da Independência de 1640. Contudo, os rumores de que a Reitoria tinha conhecimento da conspiração e pretendia frustrar a ação com força policial levaram o Comité a antecipar o ataque. Na madrugada do dia 25 de novembro, os estudantes avançaram para o assalto ao Clube dos Lentes, concretizando com sucesso a ocupação do espaço.

[rl5] AAC, [sc]

[rl6] Associação Académica de Coimbra

[rl7] Associação Académica de Coimbra

Biblioteca Geral - A Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, inaugurada em maio de 1956, é uma obra do arquiteto Alberto José Pessoa, e insere-se no vasto plano de remodelação da Alta de Coimbra promovido pelo Estado Novo. O edifício ocupa o espaço onde outrora se encontrava a antiga Faculdade de Letras, que, por sua vez, estava localizada no terreno do Colégio de São Paulo Eremita, fundado no século XVI (O Colégio de São Paulo Eremita teve uma história rica e multifacetada. Após a extinção das Ordens Religiosas, em 1834, o edifício conheceu várias utilizações: foi sede do Conselho Superior de Instrução Pública, do Instituto de Coimbra, de um Museu de Antiguidades e Arqueologia, e da Associação Académica de Coimbra. Durante algum tempo, o espaço também acolheu o Teatro Académico, que desempenhou um papel importante na vida cultural da cidade). Com o início do projeto da Cidade Universitária, o edifício foi reconvertido em 1942 para dar lugar à nova Biblioteca Geral, projetada dentro do espírito monumentalista que caracterizava a arquitetura do regime da época. A nova estrutura visava dotar a Universidade de Coimbra de uma biblioteca moderna e funcional, adequada às necessidades crescentes da investigação e do ensino, preservando, ao mesmo tempo, o estatuto simbólico e histórico do local.

Inclui:

[rl8] Biblioteca Geral, [Ruas]

[rl9] Biblioteca Geral

[rl10] Biblioteca Geral

Colégio de São Boaventura III - O Colégio foi transferido da Rua da Sofia para a Alta, ocupando o quarteirão entre a Rua de S. João e a futura Rua dos Loios. A primeira pedra foi solenemente benzida e colocada a 14 de julho de 1665, marcando o início da construção. A obra ficou concluída a 7 de setembro de 1678. No entanto, o edifício foi posteriormente demolido para dar lugar à Cidade Universitária, fruto de um ideal monumentalista que, ao privilegiar a grandiosidade arquitetónica, sacrificou a essência humana e histórica da cidade.

[rl11] Colégio de São Boaventura III, [sc]

[rl12] Colégio de São Boaventura III, [sc]

[rl13] Colégio de São Boaventura III, [sc]

Colégio de São Paulo ou Real Colégio de São Paulo de Coimbra - Este colégio foi uma importante instituição académica fundada no século XVI, integrando o conjunto de colégios criados no período áureo da Universidade de Coimbra. A construção do edifício teve início em 1549, mas só seria formalmente inaugurado a 2 de maio de 1563, embora já recebesse estudantes desde 1558. O colégio destinava-se à formação e alojamento de estudantes universitários, desempenhando um papel relevante no apoio à atividade académica. Localizava-se na Rua Larga, com um imponente fachada principal, voltada a Norte. Além disso, apresentava outras fachadas: uma virada a Sul, para a Rua do Guedes, e outra a Poente, para a Rua do Borralho, num posicionamento de referência na Alta de Coimbra. No entanto, como aconteceu com vários outros colégios, o edifício foi desativado após a extinção das ordens religiosas em Portugal, em 1834. Posteriormente, o colégio foi integrado nas obras da Cidade Universitária, levadas a cabo durante o Estado Novo. Hoje o espaço do anterior colégio é ocupado pela Biblioteca Geral da UC.

[rl14] Colégio de São Paulo, [sc]

[rl15] Colégio de São Paulo

[rl16] Colégio de São Paulo

Departamentos de Física e de Química - O projeto de autoria de Lucínio Guia da Cruz previu a conjugação de áreas científicas distintas, a Física e a Química, em torno de um amplo pátio quadrangular, organizando-se a secção de Física no flanco poente do complexo e a de Química no nascente, com os respetivos acessos a partir dos corpos opostos. O edifício foi inaugurado em 1975, após o fim do regime totalitário, e por isso não foi publicamente comemorado. Virada para a Rua Larga, a fachada principal é constituída por um amplo pórtico com fortes pilares através dos quais se acede ao pátio central, onde se encontra o maior auditório universitário, o da Reitoria, e uma cantina escolar. Além do espelho de água, fronteiro ao auditório, ergue-se, a sul, um outro pórtico com espaçosa varanda aberta sobre o Jardim Botânico [10].

Inclui:

[rl18] Departamento de Química e Física, [sc]

[rl19] Departamento de Química e Física

Faculdade de Letras - A Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, criada em 1911 na sequência da implementação da República em Portugal, surgiu como sucessora da antiga Faculdade de Teologia, extinta no mesmo ano no âmbito das reformas republicanas. A sua criação refletiu o espírito da época, voltado para a valorização das ciências humanas, das artes e do pensamento crítico. Inicialmente, a Faculdade de Letras funcionou num edifício localizado no local onde hoje se encontram a Biblioteca Geral e o Arquivo da Universidade, um espaço já central à vida académica coimbrã. Com o passar do tempo, e acompanhando o crescimento e a afirmação da Faculdade como um dos pilares do ensino universitário em Portugal, surgiu a necessidade de um edifício próprio e mais adequado às suas funções. Essa oportunidade surgiu durante a grande remodelação da Alta de Coimbra promovida pelo Estado Novo nas décadas de 1940 e 1950, que visava transformar a Universidade num símbolo monumental de poder e identidade nacional. O projeto para o novo edifício da Faculdade foi encomendado ao arquiteto Alberto Pessoa, uma figura de destaque no panorama da arquitetura modernista portuguesa. Pessoa projetou um edifício funcional e adaptado às necessidades académicas da época, respeitando os princípios da monumentalidade e da simetria que pautaram as obras da Cidade Universitária. A sua inauguração ocorreu solenemente a 22 de novembro de 1951, marcando um novo capítulo na história da Faculdade.

Inclui:

[rl2o] Faculdade de Letras, [Ruas]

[rl21] Faculdade de Letras

[rl22] Faculdade de Letras

Faculdade de Medicina - A Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra ganhou um novo edifício em meados do século XX no âmbito da ampla remodelação da Alta de Coimbra. O projeto do edifício foi confiado ao arquiteto Lucínio da Cruz, que seguiu as diretrizes estéticas da arquitetura monumentalista promovida pelo regime do Estado Novo. Este estilo, caracterizado por linhas austeras e imponentes, visava transmitir uma sensação de poder, ordem e solenidade, refletindo a importância da formação médica e o papel central da Universidade de Coimbra. A inauguração do novo edifício ocorreu em maio de 1956, sendo mais um marco na transformação urbanística e académica da Universidade. Uma das características mais marcantes do edifício da Faculdade de Medicina são as suas duas portas principais, que apresentam uma rica decoração escultórica, elemento típico do simbolismo arquitetónico da época. Cada uma das portas exibe seis altos-relevos, da autoria do escultor Euclides Vaz, que retratam figuras portuguesas que se destacaram na área das ciências médicas. Estes relevos são uma homenagem ao legado médico nacional, celebrando nomes que contribuíram significativamente para o desenvolvimento da medicina em Portugal e no mundo. Além disso, os portões de entrada são decorados com um conjunto de baixos-relevos, criados pelo escultor Vasco Pereira da Conceição, que aludem à história da medicina. Estas esculturas evocam episódios e figuras fundamentais no desenvolvimento desta ciência, sublinhando o caráter histórico e universal do edifício como espaço de ensino, investigação e memória.

Inclui:

[rl25] Faculdade de Medicina, [Ruas]

[rl26] Faculdade de Medicina

[rl27] Faculdade de Medicina

Monumento a Luís Vaz de Camões - Em 1881, a cidade compreendendo o alcance da grande manifestação nacional, associou-se à homenagem de comemorações do tricentenário da morte do poeta e, em abono da verdade, também ao imponente sentimento patriótico que o inspirava. Por essa ocasião, foi inaugurado o pequeno monumento a Camões, fechando-se assim o ciclo de solidariedade da família académica ao poeta..

[rl28] Monumento a Camões, [sc]

[rl29] Monumento a Camões e Porta Férrea

[rl30] Monumento a Camões

Fontes

  • Associação Ruas [Ruas], Universidade de Coimbra - Alta e Sofia, in https://www.uc.pt/ruas/inventory [10]

  • Câmara Municipal de Coimbra, Aqueduto de São Sebastião, in https://www.cm-coimbra.pt/areas/visitar/conhecer-coimbra/monumentos/aqueduto-de-sao-sebastiao [4]

  • Câmara Municipal de Coimbra. Património Mundias da Humanidade, in https://www.cm-coimbra.pt/areas/visitar/7-razoes-para-visitar/1-patrimonio-mundial-da-humanidade [6]

  • Câmara Municipal de Coimbra, Roteitos de Coimbra, 2003 [5]

  • Manuel Augusto Rodrigues, Arquivo da Universidade de Coimbra, [7]

  • Mariana da Silva Monteiro, Evolução da paisagem urbana na Alta de Coimbra, Relatório da prática pedagógica de Mestrado em Ensino de História e Geografia no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário, apresentado à FLUC, 2016 [1]

  • Menos é Mais, Arquitetos, Casa das Caldeiras, Coimbra, in http://menosemais.com/conteudo/casa-das-caldeiras [9]

  • Monumentos, Associação Académica de Coimbra, in http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=22406 [8]

  • Rodrigues Costa, A` Cerca de Coimbra, Feira dos Estudantes, in https://acercadecoimbra.blogs.sapo.pt/coimbra-feira-dos-estudantes-241475 [11]

  • Sérgio Madeira e Maria Antónia Lucas da Silva, Epígrafe Medieval na Rua Joaquim António de Aguiar: Contributo para a redescoberta da Alta de Coimbra, CMC, [12]

Paulo Simões Lopes, julho de 2024

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