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Esculturas dos Cunhais da Biblioteca Geral II

[ecbgII1] Enquadramento, Google Earth, agosto, 2024

Esculturas dos cunhais da Biblioteca Geral - II

O edifício joanino, onde estava instalada a Faculdade de Letras, estava esgotado e inadequado à prática do ensino superior. As Comissões de 1934 e de 1939-1940, nomeadas para definir o projeto da nova Cidade Universitária de Coimbra concordaram na necessidade da construção de um edifício próprio para uma Biblioteca Central, mas, foi só em 25 de fevereiro de 1940, durante a visita do Ministro das Obras Públicas, o eng. Duarte Pacheco, que se decidiu pela transformação do edifício da Faculdade de Letras, de modo a receber uma biblioteca.

O espaço, finalmente da Biblioteca Geral, terá sido de uma estalagem de S. Miguel de Milreus, onde depois D. Dinis fez construir a primeira sede da universidade conimbricense. Depois, aí se ergueram, sucessivamente, a efémera universidade do Infante D. Pedro, o Real Colégio de São Paulo Apóstolo (começou a ser construído em 1549, mas só viria a ser inaugurado em 2 de maio de 1563, apesar de já receber colegiais desde 1558), a Nova Academia Dramática e o seu Teatro Académico (1838-1889), o Instituto de Coimbra (1852-1868), a Associação Académica e Dramática (1868-1887), a Associação Académica de Coimbra (1887-1888), o Novo Teatro Académico (1907-1911) e, a Faculdade de Letras (1913-1951).

[ecbgII2] Boblioteca Geral da Universidade de Coimbra

Corria o ano de 1942, quando os planos da futura Biblioteca foram apresentados. A fachada uniforme, com múltiplas pilastras e janelas, seria atenuada com a introdução de dois grupos escultóricos nas extremidades, da autoria do modernista António Duarte Silva Santos (1912-1998), Mestre da Escola de Belas Artes de Lisboa. Esculpidos entre 1944 e 1950, foram assentes em 1951 e inauguradas, com o edifício em 29 de maio de 1956. Duas tríades esculpidas em pedra de Lioz, num «naturalismo simplificado», com 3,50m de altura, com a pretensão de celebrarem a dignidade do conhecimento universal.

[ecbgII3] Grupo escultórico esquerdo [sc]

[ecbgII4] Grupo escultórico direito [sc]

António Duarte seguiu a estética fascista, particularmente acutilante nos edifícios públicos, a que Nuno Rosmaninho chamou a “Expressão Totalitária da Arte”. Tudo nas estátuas estava hiperbolizado e, a este propósito, a sua imponência e grandeza com expressões despersonalizadas, suscitou crítica de alguns professores que não acolheram da melhor forma ou a arte ao serviço do poder político. Contudo, esta questão estética foi camuflada com o suposto espírito pudibundo dos críticos. Terá sido por esta via que começou a circular rumores entre a comunidade académica, de que este expoente máximo da raça, com dimensões bastante generosas, terá forçado a contratação de canteiros para desbastarem os seios às estátuas. Ora, se isso aconteceu, foi ainda em atelier e não em obra, conforme demonstra a fotografia seguinte ainda sem o assentamento definitivo da estátua na fachada da Biblioteca Geral.

[ecbgII5] Grupo escultórico direito

[ecbgII6] Grupo escultórico direito [sc]

Com os sem desbaste, o certo é que o episódio não passou despercebido à ironia dos estudantes, que logo batizaram as estátuas de “as mamudas”. E, com a hipérbole ainda mais irónica dos estudantes, as Escadas Monumentais passaram a ser a "Avenida da Marmelada", as bolas de pedra que encimam as Monumentais chamaram-lhes, primeiro os "Os xxx do Estado Novo", e depois "Os xxx de D. Dinis" e, a Praça da Porta Férrea foi batizada de "Pátio das Mamudas".

Colégio de São Boaventura III

Esculturas da Faculdade de Letras

Escultura dos Cunhais da Biblioteca Geral I

Monumento a Luis Vaz de Camões

O Grupo Escultórico da Medicina

O Grupo Escultórico das Ciências
Portão da Faculdade de Letras

Fontes:

  • AMNunes, in http://guitarradecoimbra.blogspot.com/2006/05/as-mamudas-maquete-de-um-dos-grupos.html?m=1

  • João Pedro Cardoso Gomes da Costa, “O edifício da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra (1936-1956)”, in Boletim da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, vol.46/47, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2015/2016.

  • Jorge Barradas, Nota descritiva sobre o baixo-relevo em faiança policromada, Sala de Leitura da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, 1962

  • Nuno Rosmaninho, A Cidade Universitária de Coimbra e a Expressão Totalitária da Arte, Latitudes, n.º 26, 2006

Paulo Simões Lopes, agosto de 2024