Novos dados sobre as comunidades pré-históricas recentes da região centro de Portugal permitem conhecer a aparência dos nossos ancestrais
O projeto de arqueologia MEDICE, coordenado pelo Instituto Politécnico de Tomar, Universidade Autónoma de Lisboa e associação CAAPortugal, volta a dar que falar após as escavações da Anta da Azurrague, da Lapa da Furada e do Algar da Malhada de Dentro, ocorridas em Ourém. Desta vez, com incidência um pouco mais a norte, no concelho de Alvaiázere, chegam-nos novos dados e os únicos existentes até ao momento que retratam a aparência dos nossos ancestrais nesta região.
No centro dos trabalhos está o Laboratório de ADN Antigo do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF) que isolou ADN de um dos dentes recolhidos pelos investigadores durante as escavações desenvolvidas no Complexo Megalítico de Rego da Murta. O dente número RMII218, "é de uma mulher com mais de 5000 anos" refere a coordenadora dos trabalhos de investigação Doutora Alexandra Figueiredo, docente do Instituto Politécnico de Tomar e membro do Centro de Geociências da Universidade de Coimbra. Provém de uma deposição votiva e funerária de um dos monumentos megalíticos de Rego da Murta, onde se registaram associados oferendas de ferramentas e instrumentos usados pelas antigas comunidades, bem como alimentos. "Este dente, pertence ao conjunto de restos osteológicos que os antigos grupos humanos que viviam na região depositaram, em atos ritualísticos simbólicos, cheios de significância, com base no que acreditavam, dentro das primeiras construções arquitetónicas em pedra que as comunidades humanas realizaram na europa, expressamente para os poder receber, praticar os seus cultos e poder perdurar no tempo" explica a investigadora. "Trata-se de uma deposição secundária em fossa, realizada numa anta, com uma datação que a integra no Calcolítico médio, e que ainda que tenha sido levantada e manipulada pelos ancestrais e por nós, mesmo depois de 5000 anos foi possível extrair ADN, pelo menos parcial" completa o arqueólogo e conservador Cláudio Monteiro, também coordenador do projeto.
De acordo com a equipa do Laboratório de ADN Antigo do INMLCF, António Amorim refere que foi possível obter um perfil genético incompleto, mas que permite perceber, com elevado grau de probabilidade, que o indivíduo do sexo feminino "teria uma pigmentação característica de olhos castanhos, tom de cabelo escuro e tom de pele intermédia a escura" e, de acordo com a sua linhagem materna, pertenceria ao "haplogrupo R, que se estima terá surgido entre 70 000 e 50 000 na Eurásia".
O projeto MEDICE que integra vários centros de investigação e universidades estrangeiras e nacionais como parceiros tem como principal objetivo estudar as comunidades da pré-história recente na região centro, dedicando-se atualmente a Ourém, Tomar e Alvaiázere. De acordo com os investigadores pretende-se, com os dados genéticos, ter uma visão geral da população e perceber relações, contactos e linhas de descendência, que inclusive os ligue às comunidades atuais que vivem nestas regiões.