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Conímbriga

O interesse pelas ruínas de Condeixa-a-Velha, isto é, da antiga cidade romana de Conímbriga, manifestou-se de imediato nos primeiros passos da Secção[34], com reuniões de discussão, análise de objetos e recolha de alguns deles no museu, e até trabalhos de campo, pelo menos em iniciativas individuais de sócios. O tema foi introduzido por Miguel Osório Cabral de Castro em sessão da comissão, à qual presidia, em 2 de abril de 1873, oferecendo-se para aí se deslocar a expensas suas, junto com A. Filipe Simões, para explorar as antiguidades locais.

O que se conhecia então dessas ruínas era incipiente, perspetivando-se no entanto a sua origem e potencial valor. Faltava, pois, planear um estudo prático aprofundado sobre as ruínas, que estavam mais ou menos à mercê dos interesses e das ignorâncias da população local. O resultado daquelas explorações foi discutido nas sessões de 5 de junho e de 6 de novembro do mesmo ano.

Na primeira dessas sessões, Miguel Osório Cabral de Castro ofereceu ao Museu do Instituto uma lápide datada do ano 541, encontrada junto da igreja de Condeixa-a-Velha. A sua inscrição vem reproduzida no volume 17 d’O Instituto. Prometeu o mesmo sócio o envio de uma grande quantidade de moedas antigas achadas naquela localidade. Descrevendo as ruínas, concluiu o seu discurso nessa sessão declarando não lhe restarem dúvidas de ter existido naquele lugar uma importante povoação romana. Questiona no entanto se seria uma cidade, inclinando-se para a suposição de que se tratava de um acampamento romano.

Após um período de interregno motivado pelas férias escolares, a Secção de Arqueologia voltou a reunir a 6 de novembro de 1873, onde prosseguiu a discussão acerca das ruínas de Condeixa-a-Velha e sua relação com a hipótese da existência de uma povoação romana no local onde hoje de situa a cidade de Coimbra. Neste dia, dominou o discurso de Augusto Filipe Simões, que acentuou a importância daquelas ruínas, mas manifestou discordância sobre a opinião de Miguel Osório, refutando a teoria do castrum ou acampamento e defendendo a tese de que os vestígios eram de uma grande cidade romana, apresentando diversos argumentos a seu favor.

O interesse deliberado dos sócios da Secção no estudo das edificações remanescentes de Conímbriga foi ainda incentivado pela proposta que Mendonça Cortês apresentou, em sessão de 5 de fevereiro de 1874, para a criação de um fundo especial destinado à exploração das ruínas de Condeixa-a-Velha, com o apelo à subscrição de sócios e não sócios. Submetido ao exame de uma comissão, o plano seria aprovado em sessão de 16 de abril de 1874, já depois de instalada em definitivo a Secção de Arqueologia, uma vez terminados os trabalhos da comissão fundadora, em 12 de fevereiro desse ano. Ora, a proposição de Mendonça Cortês foi não só ratificada como também acompanhada de um regulamento que dirigia os trabalhos de exploração das ruínas. À medida que foram efetuando escavações descobriram diferentes vestígios de interesse, de que o catálogo dos objetos recolhidos no museu dá testemunho.

Um outro momento essencial e de maiores repercussões deu-se após a reorganização da Secção, elaborando-se um projeto de escavações que a Rainha D. Amélia, esposa do Rei D. Carlos, apoiou, em 1899, com recursos monetários indispensáveis à prossecução dos trabalhos. Obtido o favorecimento e o interesse da Rainha, a Secção deslocou-se a Condeixa e planificou a exploração das ruínas, colocada em prática ainda no mês de março de 1899. A dirigir os trabalhos encontravam-se Augusto Gonçalves e António de Vasconcelos[35]. Muitos dos objetos encontrados eram levados para o museu. Um deles foi oferecido em agradecimento a D. Amélia[36].

A notícia que António Augusto Gonçalves publicou por essa altura na revista Portugalia enaltecia o contributo do projeto: “A quantidade e diversidade dos objetos encontrados – arquitetura, olaria, utensílios e pedaços corroídos de instrumentos de ferro – dará um relatório extenso que, para ser útil, exige meditação e estudo” (Gonçalves, 1899: 359). Pretende, não obstante, dar maior ênfase aos mosaicos desvelados durante as escavações e que foram transferidos para o museu do Instituto. Lamenta, contudo, que se tenha noutros tempos destruído por incúria e ambição objetos importantes, ou simplesmente o desprezo e a indiferença para com aquelas “velharias”, não esquecendo que uma parte do espaço muralhado era aproveitada para culturas agrícolas.

O arqueólogo Bairrão Oleiro sublinha, num artigo de 1973, as diligências do Instituto sobre as antiguidades de Conímbriga: “As ruínas de Condeixa-a-Velha interessavam vivamente a Secção de Arqueologia, pois logo na sessão de 5 de junho [de 1873] Miguel Osório apresentava sobre elas uma comunicação em que defendia o ponto de vista de que as ruínas não correspondiam a uma cidade, mas a um acampamento. Pouco depois, em 6 de novembro, Filipe Simões sustentava, com melhor interpretação dos testemunhos arqueológicos e mais exata noção das realidades, a opinião contrária: ali existira não um acampamento, mas uma grande cidade” (Oleiro, 1973: 68). Ainda de acordo com Bairrão Oleiro, “a ação desenvolvida em Coimbra nos campos da Arqueologia e da História da Arte, bem como o mecenato da Rainha, tiveram repercussão nos círculos especialmente interessados” (Oleiro, 1973: 72), incluindo a capital.



[34] Na verdade, o movimento arqueológico do Instituto revelou-se quando ainda se chamava Instituto Dramático e dependia da Nova Academia Dramática. Já em 1840 o Instituto lançava um alerta sobre a necessidade de conservar e estudar os vestígios do passado, e efetuava explorações das ruínas de Conímbriga, como se pode ver por este parágrafo da Crónica literária da Nova Academia Dramática (nº 10, 2.5.1840): “A Direção, acompanhada por alguns membros do Instituto Dramático, pelo Presidente do Instituto de Pintura, e vários outros académicos, deu princípio às suas explorações no dia 23 de abril próximo passado, visitando as ruínas da antiga Conimbrica, situada a duas léguas de distância, a O. S. O. de Coimbra, junto à pequena povoação ora chamada Condeixa-a-Velha. Não foi todavia suficiente o decurso de um dia para bem perscrutar aquelas vastíssimas ruínas, onde coligimos várias medalhas e moedas dos romanos, e algumas inscrições”.

[35] Cf. O conimbricense, 25 fev. 1899; O tribuno popular, 1 e 4 mar. 1899.

[36] Cf. O tribuno popular, 15 nov. 1899.